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Alô creator: seu trabalho vai financiar o cinema brasileiro e você não vai ganhar nada com isso. (A não ser que leia este texto até o final).

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Talvez você não esteja sabendo, então vim aqui botar lenha na fogueira da PL do Streaming que, apesar de mirar nas big techs, tem tudo a ver com o seu negócio.

O Projeto de Lei (PL) que visa regulamentar os serviços de Vídeo sob Demanda (VoD) no Brasil e que, provavelmente, será votado na próxima quarta-feira, tem o objetivo nobre de fomentar a produção audiovisual nacional. E, como diz minha podcaster preferida — Mabê Bonafé: “Até aí, tudo bem”.

Acontece que o mecanismo principal dessa PL é a cobrança da Condecine (Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional) sobre o faturamento das plataformas. E aí reside uma confusão primária nesse conceito: a lei mistura plataformas que produzem ou compram conteúdo para seus catálogos (Netflix, Globoplay e afins) com plataformas onde o conteúdo é gerado pelo usuário (YouTube, TikTok, Instagram, etc.), ou seja, por você, creator.

No enquadramento das plataformas de compartilhamento, como o YouTube (que, vamos aqui dar o devido crédito, é a única que tem um mecanismo transparente e constante de repasse da receita de publicidade para o creator), nós chegamos a uma questão crucial: os criadores de conteúdo, que NÃO SÃO o público-alvo original da política de fomento, se tornarão financiadores indiretos do cinema brasileiro SEM ter acesso aos mesmos benefícios.

 

O Creator: Empreendedor da Nova Economia Criativa

Ao contrário do que alguns políticos podem imaginar, os creators brasileiros não são a imagem e semelhança de Virgínias e Carlinhos — as aberrações desse ecossistema, que ganham milhões com propagandas duvidosas e jogos de azar. Criadores brasileiros são, na verdade, milhares de empreendedores da nova economia criativa.

Pessoas que, movidas por suas paixões, começam a criar conteúdo e, em um exercício de performance e estratégia, se transformam em empreendedores e geradores de empregos. Na nossa pesquisa Creators & Negócios, vemos que 36% dos creators têm equipes próprias e 52% destes empregam mais de 5 pessoas. Isso é impacto econômico real.

Milhares de creators produzem diariamente conteúdo de entretenimento, educação, jornalismo e cultura, impulsionando a diversidade e a narrativa brasileira. Eles são, inegavelmente, um setor vital do audiovisual contemporâneo.

Além disso:

  • Ascensão Social: A Creator Economy é, para muitos, uma ferramenta poderosa de ascensão social e inclusão produtiva. Pessoas de todas as regiões e classes, que jamais teriam acesso aos mecanismos tradicionais de produção cinematográfica, encontraram na produção de conteúdo independente um meio de gerar renda e construir um negócio rentável.

  • Trabalho Sem Incentivo: Essa produção, gigantesca e economicamente relevante, é feita majoritariamente sem qualquer incentivo, financiamento ou acesso a fundos públicos. O creator assume integralmente o risco do seu empreendimento.

 

Uma Taxação em Cascata

Ao taxar as plataformas de compartilhamento, o PL estabelece um paradoxo:

A Condecine, imposto cujo destino é o Fundo Setorial do Audiovisual (FSA), incide sobre a receita gerada pela publicidade veiculada nos vídeos. No caso do YouTube, que repassa cerca de 55% dessa receita ao criador, o imposto sobre o faturamento da plataforma é, na prática, uma taxação sobre o valor gerado pelo trabalho do criador de conteúdo.

Ao taxar a plataforma, o PL cria uma situação em que o empreendedor da creator economy está subsidiando o cinema tradicional, sem usufruir dos fundos que ele próprio ajuda a construir. O creator é tratado como fonte de receita, mas não como destinatário legítimo das políticas de fomento à cultura.

Resumindo: O PL do Streaming é necessário para garantir a soberania cultural brasileira, e não questionamos isso. Contudo, ele corre o risco de ser financiado pelo trabalho sem incentivo público do criador de conteúdo, que, reforço, é um empreendedor como outros tantos, e que tem dificuldade em acessar o FSA, que já acumula um superávit financeiro de centenas de milhões de reais por má execução.

Ao ignorar a diferença entre o cinema tradicional e o creator empreendedor digital — que é uma força de produção cultural e ascensão social — a proposta transforma o creator em um contribuinte silencioso e sem nenhuma contrapartida.

 

O que eu mudaria no texto do PL? 

1. Redução da Alíquota como Incentivo Fiscal para o Repasse Direto

O PL pode estabelecer que a alíquota da Condecine VoD seja inversamente proporcional ao repasse de receita publicitária da plataforma ao creator. Na prática, a plataforma que comprovar um repasse direto e transparente de X% da receita de anúncios (alinhando-se ao market standard de 50% ou mais) terá direito a uma alíquota reduzida da Condecine.

Isso, de certa forma, pressiona as plataformas que não repassam receita (Meta e TikTok) a reverem suas políticas de remuneração em troca de benefício fiscal. YouTube sairia na frente; Meta e TikTok teriam que, finalmente, repensar suas políticas e, quem sabe, repassar receita para o creator para não pagar imposto. Será que assim a coisa muda?

 

2. Reinvestimento Estratégico: Criando o FSA-Creator

O dinheiro que for arrecadado precisa ter um destino justo. O PL deve garantir que essa receita retorne ao seu ecossistema, exigindo a criação de um Subfundo de Fomento à Economia Criativa Digital (o “FSA-Creator”). Pela lei, pelo menos 50% da Condecine arrecadada de plataformas de Conteúdo de Compartilhamento deve ser direcionada a essa rubrica obrigatória. Esse fundo deve financiar editais simplificados e fáceis de serem acessados, garantindo que o recurso gerado vá para quem mais precisa escalar seu negócio.

3. Desburocratização e Foco em Performance para o Acesso ao Recurso

Não adianta criar um subfundo se o processo de acesso for o mesmo da burocracia do cinema. O PL tem de impor a criação de linhas de investimento ágeis, digitais e desburocratizadas para o FSA-Creator. O acesso ao capital não pode depender de pilhas de documentos e análises lentas, mas sim da performance. Deve-se permitir que o recurso chegue rapidamente ao creator, com tetos menores e um processo de match-funding simplificado, valorizando o que realmente importa: a execução.

4. Desobrigação de Cotas de Catálogo para o Conteúdo Gerado pelo Creator

O PL precisa diferenciar o Conteúdo de Criador Empreendedor (Creator Content) do produto licenciado (Originals). Não faz sentido impor cotas de catálogo às plataformas que não têm controle sobre a produção. Não é o YouTube ou o TikTok que decide o que vai pro ar. Portanto, o projeto precisa excluir o Conteúdo de Criador da obrigação de cotas, concentrando essa exigência apenas em obras licenciadas.


Agora é com você, creator:

Se alguém vai ler e considerar minhas sugestões, eu não sei. Mas se os creators todos fizerem este artigo chegar ao relator da PL, Doutor Luizinho (que, a propósito, é médico, e provavelmente não é muito fluente em Creator Economy), quem sabe ele não faça algumas pequenas alterações no texto? Elas não mudariam em nada a vida do pessoal do cinema, mas deixariam 10 milhões de creators brasileiros felizes.

 

Me ajuda a espalhar?

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